Já não é a primeira vez que escuto que quem busca um parto natural “está querendo provar alguma coisa para si mesma”. Parei para pensar. Será? Se assim é, o que estaria eu tentando provar, ao desejar e batalhar por um nascimento natural para as minhas filhas?
Quer saber? Puxa, eu estava tentando provar muitas, muitas coisas…
Em primeiro lugar, talvez eu estivesse tentando provar poder cumprir o papel que me foi presenteado pela natureza, ao me fazer vir ao mundo fêmea, mulher, parideira, o papel que me outorgou a biologia: gestar e parir minhas crias sem auxílio de terceiros, sem ajudas medicamentosas, sem instrumentos ou intervenções desnecessárias. Provar que eu poderia, sim, fazer o que toda fêmea mamífera faz: dar à luz, trazer, por minhas próprias forças, meus filhotes ao mundo.
Talvez eu também desejasse provar ter consciência suficiente para fazer minhas escolhas com responsabilidade, para optar pelos caminhos mais saudáveis e respeitosos para mim e minhas filhas, evitar riscos desnecessários, velar pelo bem estar de minhas bebês, por sua saúde e por seu direito inalienável a uma chegada harmoniosa e respeitosa a esse mundinho.
Talvez eu quisesse provar ainda que, ao contrário do que a maioria pensa, senso comum nem sempre significa bom senso. Que não é porque vivemos em um país em que por volta de 80% dos nascimentos acontecem por cesariana, que devemos aceitar isso como realidade irrefutável. Que nadar contra a corrente é, muitas vezes, imprescindível. Que não devemos nos calar diante do que está errado nem seguir com a boiada, que precisamos sempre buscar aquilo que é certo para nós, ainda que nos rotulem de radicais, irresponsáveis, vaidosas, loucas, ou seja lá mais o que for.
Outra coisa: talvez eu quisesse provar também que dor não tem nada a ver com sofrimento, como diria Adélia Prado, linda Adélia. Queria provar que é possível a gente encarar a dor como algo que faz parte da vida, que traz crescimento, que nos faz melhores, mais inteiros, mais capazes. Não de um jeito bobinho, de achar que sentir dor me faz melhor do que ninguém. Mas encarando a dor com maturidade, como alguém que sabe que crescer é assim mesmo, às vezes dói. E que é só encarando as dores naturais da vida de frente, sem fugas e sem atalhos, que se vira gente e se segue adiante com maturidade, coragem e inteireza.
Mas antes de tudo, o que eu queria provar ao parir minhas filhas naturalmente não tem nada a ver com quem olha de fora, o mais importante de tudo isso não era provar nada para ninguém, nem pra mim mesma. Eu queria, acima de tudo, provar, mas modificando o verbo e olhando de outro jeito: eu queria provar o gosto. Saborear, deliciar-me. Eu queria sentir cada instante da chegada das minhas filhas ao mundo, estando alerta, consciente, presente. Eu queria vivenciar cada pedacinho do processo para relembrar depois, tantas e tantas vezes, com uma saudade que jamais imaginei que pudesse sentir. Queria recebê-las de olhos bem abertos, tocá-las com a ponta de meus dedos curiosos e tão cheios de amor, envolvê-las, acolhê-las em meu peito, olhar em seus olhinhos ávidos e pensar: ‘nós passamos por isso juntas. essa foi a primeira de muitas caminhadas que faremos pela vida afora, de mãos dadas. e nós conseguimos, eu e você!’.
E foi assim que aconteceu. Eu provei, sim. Provei, e foi bom demais. Provei do gosto, o melhor de todos, um gosto que nessa vida, duvido que haja igual. Porque parir naturalmente tem um gosto que não se explica, só dá pra sentir. Se eu fosse tentar definir, diria que tem gosto de arcoíris depois da chuva. Assim, pura poesia, delicadeza e intensidade.
Desse gosto, depois que provei, eu não me esqueço nunca mais. Levo comigo pra sempre, no brilho dos meus olhos, na ponta dos dedos. E pra quem não sabe que gosto tem porque desistiu sem nem tentar, eu só posso dizer: quem sabe, quem sabe um dia. Nunca é tarde pra se provar. Né?
Por TataBlog Mamíferas
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